"Fui à floresta viver de livre vontade, para sugar o tutano da vida. Aniquilar tudo o que não era vida. Para, quando morrer, não descobrir que não vivi". (Henry David Thoreau)
"Fui à floresta viver de livre vontade, para sugar o tutano da vida. Aniquilar tudo o que não era vida. Para, quando morrer, não descobrir que não vivi". (Henry David Thoreau)
Afinal, a madeira da "cadeira de sonho" tinha caruncho e partiu-se. Na loja do mestre André venderam-se ilusões, promessas e juras eternas, nada que qualquer fax e uma transferência bancária não resolvam. No entanto, parece que havia outro, o adjunto, transformado em obreiro de títulos de última hora. Gabo-te a coragem por saberes que os clientes do costume viriam à tua loja apresentar reclamação, furibundos, chamando-te traidor e apelando às vigílias. Obrigado mestre André por este alto momento de comédia e ironia, aprendeste com os melhores, porque foi preciso alguém de sangue azul pagar na mesma moeda a quem inventou a arte de desviar jogadores e treinadores praticamente assegurados noutros clubes utilizando o cinismo e o poder do dinheiro.
Chamou-me a atenção uma demolição de uma habitação de um humilde agricultor por ordem do tribunal, dentro da área protegida do Parque Natural da Arrábida. Entre duvidosas licenças de construção concedidas pelas Câmaras da zona e os jogos de interesse político, estranho a insensibilidade atroz de a mandar abaixo, a quem por diversas vezes já a tentou legalizar, neste santuário de flora e fauna sujeita a outros tipos de pressão humana que as entidades competentes ignoram: a irritável presença das motos de água, a pesca ilegal, a urbanização desenfreada, as pedreiras que esventram a serra e, a cereja no topo do bolo, uma cimenteira de massiva produção industrial que nunca largará o espectro da co-incineração.
Fui à aldeia da Pena, lá para os lados da fronteira entre os concelhos de São Pedro do Sul e Arouca - o fim do Mundo onde o morto matou o vivo! A Pena dá pena, não teve a sorte da homónima de Góis, pois não pertence às Aldeias do Xisto de Portugal. Só pode contar com a ajuda divina de São Macário pois o poder camarário e político já a abandonou há muito tempo. Suja e escura como a lousa que a cobre, com meia dúzia de habitantes, com casas em ruína, sem rede de saneamento, com acessos difíceis e vertiginosos, desaproveitada turisticamente, não faz jus à beleza natural e agreste do Maciço da Gralheira. Pena, dá pena ver o Norte guerrear o Sul em nome do já gasto argumento do centralismo quando permaneces na ignorância de tais escribas, no marasmo, perdida no isolamento e na tua identidade cultural.
Neste país subalugado à "troika" internacional, não me parece que o novo Governo tenha dedos para tocar a guitarra. Decantando-se o ódio visceral e os boatos pessoais contra José Sócrates, resta uma mão cheia de nada: a prometida revisão constitucional, a discussão gasta e inútil sobre o referendo do aborto, a emigração forçada, o corte no subsídio de desemprego e o constante matraquear sobre a flexibilização laboral, a degradação social e o previsível aumento do IVA. O país virou à direita mas acho que continuará um zero à esquerda, também muito pela acção suicida dos líderes do Bloco e do PCP, orgulhosamente sós e desfasados da realidade, e que pela primeira vez na vida podiam ter copiado a dignidade democrática e o adeus do ex-Primeiro-Ministro e demitirem-se.
Após 20 anos de proibição, a caça ao melro passa a ser permitida só porque o Estado acha que sim, ignorando os conselhos de várias entidades ambientais e violando as regras elementares do bom senso. Nunca a expressão "cada tiro cada melro" fez tanto sentido. Aliás, aguardo ansiosamente para que também seja permitido encher de chumbo os pardais e as andorinhas, na sequência desta desastrosa política ambiental e cinegética. O harmonioso canto do melro calar-se-á perante os pistoleiros de fim-de-semana, espécie de vazadouros de frustrações, de gatilho fácil , atarracados nos seus coldres, sempre com a benção do poderoso lóbi da caça e do cheiro a patuscadas de estilo macabro.